Os dejetos de suínos utilizados como fertilizante agrícola podem apresentar toxicidade para a fauna que habita o solo (edáfica). O trabalho da zootecnista Júlia Corá Segat realizado na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba, avaliou o potencial toxicológico dos dejetos em solos de Santa Catarina, utilizando como ferramenta a ecotoxicologia terrestre, que mede os efeitos na letalidade, reprodução, desenvolvimento e comportamento dos seres vivos existentes no solo. O estudo de mestrado aponta a importância da utilização de solos naturais de diferentes texturas e de diferentes organismos na avaliação de toxicidade.
Criação de suínos gera aporte de dejetos, usados como fertilizante, nos solos.
A zootecnista avaliou por meio de testes ecotoxicológicos os efeitos de doses crescentes de dejeto de suínos — 0, 25, 50, 75 e 100 metros cúbicos por hectare (m3 ha-1), baseando-se na recomendação da legislação catarinense para esse resíduo (50 m3 ha-1). Em diferentes tipos de solo (Argissolo Vermelho Eutrófico, Latossolo Vermelho Distrófico, Neossolo Quartzarênico e Solo Artificial Tropical) avaliou-se a sobrevivência, a reprodução e o comportamento de minhocas (Eisenia andrei) e colêmbolos (Folsomia candida), uma espécie de inseto, a partir de metodologias padronizadas internacionalmente.
“Os resultados das avaliações com minhocas mostraram que no Neossolo Quartzarênico a toxicidade do dejeto causou letalidade a 100% dos animais nas duas maiores doses testadas”, conta Julia. Para os testes avaliando o potencial reprodutivo, as doses testadas em Neossolo Quartzarênico tiveram efeitos negativos em minhocas, mas nos outros solos não ocorreu efeito perceptível.
Os resultados obtidos para testes em colêmbolos mostraram toxicidade em todas as doses testadas, causando letalidade significativa na menor dose de dejeto aplicada e, baseado nessa resposta, doses menores foram usadas para avaliar o efeito crônico e comportamental (0, 10, 15, 20 e 25 m3 ha-1). As doses usadas para o teste de reprodução causaram redução no número de juvenis gerados em todos os solos testados. “No teste de comportamento foi observada fuga dos organismos do solo tratado com as duas maiores doses de dejeto de suínos”, ressalta a pesquisadora.
De acordo com a zootecnista, a ecotoxicologia terrestre é utilizada para avaliar efeitos de substâncias que, quando adicionadas aos solos, causam impactos em organismos, mensurando as respostas de alterações na taxa de letalidade, reprodução, desenvolvimento e comportamento de organismos edáficos padronizados. “No Brasil a ecotoxicologia terrestre é uma ferramenta nova e pouco utilizada, que vem sendo aos poucos implantada no país, em alguns centros de pesquisa. Já na Europa é amplamente usada e até obrigatória para indicar a toxicidade de resíduos que possam ter como destino os solos”, explica a pesquisadora.
Júlia enfatiza a necessidade de desenvolver estudos utilizando a ecotoxicologia terrestre como ferramenta de avaliação por apresentar respostas rápidas e confiáveis sobre a toxicidade de substâncias incorporadas a solos. “Os resultados dessas avaliações também servem de subsídios para estabelecer valores limites de aplicação de resíduos em solos”, destaca.
O trabalho, apresentado no programa de Pós-graduação de Solos e Nutrição de Plantas da Esalq, teve o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e da Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). A orientadora foi a professora Elke Jurandy Bran Nogueira Cardoso, do Departamento de Ciência do Solo (LSO) da Esalq.
O Brasil ocupa atualmente a quarta posição entre os produtores mundiais de carne suína e o estado de Santa Catarina é responsável por 25% desta produção. Nesse estado brasileiro, a intensificação da produção em pequena área territorial gera um grande aporte anual de dejetos de suínos por unidade de área agrícola. Isso porque a alternativa mais utilizada para descarte desses resíduos é a sua aplicação como fertilizante agrícola, prática que tem gerado um dos maiores problemas de poluição ambiental e de impacto nos organismos que habitam os solos (edáficos), especialmente na região Oeste Catarinense.
Caio Albuquerque | Agência USP
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